segunda-feira, 25 de abril de 2011

Páscoa: passagem pela morte até à ressurreição

 
1. O mistério da Páscoa, que quer dizer «passagem», é um mistério fundamental para a nossa vida de cristãos. A Páscoa culmina na ressurreição, mas começa na paixão e morte de Jesus. É esta passagem de Jesus para a ressurreição que assenta a nossa salvação. É em Jesus ressuscitado que somos salvos da morte, porque com Ele ressuscitaremos um dia. Mas para lá chegar está antes à paixão.

S. Pedro, após o Pentecostes, anunciava aos muitos que o ouviam: a este Jesus, vós o matastes, crucificando-o pela mão dos ímpios; mas Deus o ressuscitou, e disso nós somos testemunhas. Portanto, exaltado pela direita de Deus, ele recebeu do Pai o Espírito Santo prometido e o derramou, e é isto o que vós vedes e ouvis (Act 2, 32-33).

Mais tarde escreveria S. Paulo: Se Cristo não tivesse verdadeiramente ressuscitado, então nós, os cristãos, seríamos os mais infelizes dos homens, porque é precisamente nessa verdade que assentamos toda a nossa fé e toda a nossa esperança. Em Atenas, S. Paulo ensaiou um discurso evangelizador nitidamente orientado para espíritos pagãos, mas racionalistas.

Chegou a referir o tópico de o homem ser da raça de Deus. Mas quando chegou a ponto de dizer que Deus constituiu um Senhor para julgar o mundo com justiça pelo ministério de um homem que para isso destinou; e que a todos deu como garantia disso o fato de tê-lo ressuscitado dentre os mortos (Act 17,31), então os gregos riram-se dele, exceto uns poucos, que acreditaram.

2. A Páscoa é o completamento da Encarnação. É a finalidade da vinda de Cristo -- que após a ressurreição esteve com os Apóstolos apenas durante um curto período e logo subiu ao céu. Não importa tanto o completamento histórico, temporal; importa, sobretudo o completamento salvífico espiritual, sobre o qual foi instituída a Igreja, e manifestada e animada no Pentecostes. É o início de um novo tempo, o da Igreja de Cristo animada pelo Espírito Santo, que caminha para o fim dos tempos da segunda e definitiva vinda de Cristo.

Porque foi pela Ressurreição que nos foi ganho o Pentecostes: é Jesus glorificado que derrama sobre a Igreja nascente o Espírito Santo que prometera, e que permanece conosco. Como diz o Catecismo da Igreja Católica (CIC, 767), «consumada a obra que o Pai confiou ao Filho para cumprir na terra, no dia de Pentecostes foi enviado o Espírito Santo para que santificasse continuamente a Igreja».

Quando na festa dos Tabernáculos Jesus anuncia o futuro envio do Espírito Santo, dizendo: «se alguém tiver sede venha a mim e beba. Como diz a Escritura, do seu seio correrão rios de água viva», S. João esclarece escrevendo: «Dizia isso referindo-se ao Espírito Santo que haviam de receber os que cressem nele, pois ainda não fora dado o Espírito visto que Jesus ainda não tinha sido glorificado» (Jo 7,37-39).

3. Num recente livro publicado entre nós, intitulado «Encontro com Cristo, Plenitude do Ser Humano», o teólogo Garcia Ambrosio expõe de modo muito interessante o pensamento teológico e espiritual de um autor espanhol, em que se acentua a importância da idéia do encontro pessoal de cada um de nós com Deus, em Jesus Cristo. E numa terceira parte, sobre o encontro com Jesus Cristo, inclui reflexões de que fazemos aqui um breve excerto.

Escreve Garcia Ambrosio: «Na ressurreição, Jesus é constituído como verdadeiro messias, ou seja, como aquele que verdadeiramente traz a salvação para os homens, o mesmo é dizer, como aquele que possibilita o verdadeiro encontro com Deus.

Mas isto só pode ser uma realidade porque a própria humanidade de Jesus foi glorificada; porque a humanidade de Jesus acolheu totalmente a ação glorificadora de Deus sobre ela. Por isso o destinatário da ressurreição é, em primeiro lugar, a pessoa de Jesus». (...) Na verdade, (...) o fundamento real constitutivo de Jesus como Cristo é a ressurreição. Esse é o instante definitivamente esclarecedor, mesmo para Jesus, da sua filiação como Filho».

4. Assim se pode compreender que é no nosso encontro com Jesus ressuscitado (incorporação, comunhão) que podemos ser salvos. Pelo batismo do Espírito Santo (que é o Espírito de Jesus), e alimentados pela Eucaristia, somos incorporados em Cristo, no Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja; e tudo fica espiritualmente mais claro para a nossa fé.

Mas se a Ressurreição de Jesus Cristo nos é oferecida como salvação e nossa ressurreição na incorporação em Cristo, pelo batismo do Espírito que Cristo nos prometeu e depois derramou em Pentecostes permanente na Igreja, isso não deixa de ser também para nós uma passagem, que começa na conversão (foi este o primeiro apelo de Jesus: «convertei-vos») e continua na passagem que é a nossa própria paixão.

Por isso celebramos a Quaresma e depois a Páscoa. Por isso comungamos o Corpo, mas também o Sangue de Cristo. Podemos começar pelo Corpo e pela Páscoa de Cristo, porque tal já nos foi ganho; mas não ficamos dispensados de nos associarmos à sua Paixão com a nossa paixão, ao seu sangue com o nosso sangue, isto é, com a nossa renúncia e o nosso abandono - que é verdadeiramente o nosso sacrifício e a nossa morte humana.

S. Paulo aconselhou-nos a completar, com a nossa, a paixão de Cristo. Todo o caminho ascético do cristão é isto mesmo. E não há que temer. Jesus disse: o meu jugo é suave e o meu fardo é leve (Mat 11,29). E é mesmo, ainda quando possa haver dor e queda. É a experiência de todos os místicos, que são os espirituais que foram mais longe na experiência de Deus, de quem, por isso, mais vale a pena ouvir o testemunho. Diretamente ou através do discernimento e do conhecimento dos doutores da Igreja.

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