quarta-feira, 25 de março de 2015

Reflexão - "Fragmentos de "Diário de um sonhador" parte I

Era 04 de dezembro, quinta-feira, numa manhã aparentemente comum a tantas outras. Acordei cedo, fui até a janela ver os primeiros raios de sol, e por alguns minutos me vi concentrado em dois pombos que disputavam alguns grãos de milho...
Após um banho frio, me arrumei, despedi-me de minha mãe, a quem deixo numa cadeira de balanço e uma xícara na mão. Percorro alguns quarteirões, até chegar na casa de meu cunhado, onde pego emprestada sua moto, no intuito de chegar no horário, no trabalho.
Antes de ligar o motor, uma pessoa me manda uma mensagem no celular, me desejando bom dia, bom trabalho...
Faço o sinal da Cruz e peço a Deus que esteja comigo! Algo apertava meu peito, uma angústia, um tremor. Ainda assim, rodo a chave, mudo a marcha e acelero. Sigo meu caminho num trânsito conturbado, barulhento, em que qualquer brecha entre um carro e outro é motivo de conquista.
Tudo percorria bem. Ao parar em um sinal, tiro o celular do bolso... 07:55, ou seja, faltavam 5 minutos para meu horário. De repente sinto bater no ombro algumas gotas de chuva. Rapidamente o céu escureceu... O sinal está verde, me dando permissão a seguir!
De longe avisto um retorno e logo dou sinal de pisca, dando o entender que ali entraria. Estou há menos de 40 km/h. Numa questão de segundos, sinto algo encostando na trazeira da moto, fazendo-me acelerar. Fazendo-me perder o controle e derrapar na pista que se encontrava molhada pela chuva...
Sem entender bem o que me acontecia, me vejo caindo numa altura de mais de 6 metros, sem acreditar que aquilo era real. Após alguns segundos, segundos esses que me duraram mais que minutos, senti-me num impacto jamais imaginado. O solo daquele lugar me abraçava apertado. Primeiro a cabeça e em seguida cada membro de meu corpo. Um desespero invadiu cada fragmento de minha consciência, ao perceber que havia uma moto deitada toda em cima de mim, com o cano queimando minhas costas, uma água escura dentro de meu capacete... Sem poder falar, sem poder respirar, sem poder me mexer... Uma dor inexplicável, inigualável!
Um doce beijo... Sim! Da mais bela dama! Era a morte, numa tentativa sedutora de me ter para sempre em seus braços!
Busco toda força, força que nem sabia ter, e levanto meu corpo até a cintura, mesmo com todo o peso daquele veículo, ponho o rosto fora d'água e grito! Grito o mais alto, o mais significativo possível, e volto a me aprofundar... No mais profundo de meu ser. Estava como Heitor, defendendo Tróia, diante do poderoso exército grego. Eu precisava vencer aquela guerra. Quando Deus, do mais alto dos Céus, envia um de seus anjos, que me puxa pela mão! Uma luz reacende diante de meus olhos...
Eram homens, que desceram aquele lugar, no intuito de ainda encontrar vida nesse corpo que se encontrava em êxtase. Tiraram a moto, me ajudaram a me virar.
Tirei minha mochila das costas, meu capacete, o sapato de meu pé direito, meus óculos, meu celular... E nem percebi que minha coxa esquerda estava quebrada, com o osso à amostra, com uma fratura exposta. De todas as formas, homens buscavam me ajudar, homens desconhecidos, que nunca terei como agradecer!
Estirado estava eu, ainda dentro daquele Canal, sendo, por longos minutos, o alvo de curiosos, em que ouvia orações de alguns, repúdio de outros, entre piadas e até desprezo. Algo de diferente sentia em minha boca, eram meus dentes, pendurados pelo aparelho.
A AMC controlava o trânsito. Após 55 minutos, chega o Corpo de Bombeiros, mas nem eles tiveram a coragem de mexer em mim, pela proporção de tudo. Se admiravam pelo fato de estar vivo, falando e consciente.
Eu não conseguia acreditar... "E como dar aquela notícia à minha mãe? Meu trabalho precisava de mim! Como entregar a moto que meu cunhado havia comprado recentemente? Como ia começar minha faculdade? Como ia viajar no Natal?" Eram os pensamentos que circulavam minha mente...



(De Dan Fonteles)

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